Nas comemorações dos 70 anos da Revolução Russa, Gorbachev, em seu discurso oficial, indagou: "Como estará o mundo em 2017, quando comemoraremos o centenário da Revolução de Outubro?"
Gorbachev ainda está vivo, mas a Revolução morreu. O mundo é outro. A Rússia é outra. Morreu o comunismo russo, morreu a URSS e morreu a grande utopia de uma geração sonhadora, que chegava até àquele jovem ginasiano lá de Viana.
Naquele 25 de dezembro de 1991, quando Gorbachev renunciou ao cargo de Secretário-Geral do Partido Comunista, desmoronou-se um império que durou 74 anos de existência, cumprindo, assim, por ironia, a assertiva de Marx: "Tudo que é sólido desmancha no ar".
A Revolução de 1917 foi o maior acontecimento do século XX. Depois, seguiram-se a revolução chinesa (1949) e a cubana (1959). O êxito desses movimentos firmou a concretização das teorias de Marx, Lênin, Trotsky e outros pensadores revolucionários que desejavam dar o grande salto dialético em busca de uma síntese que representasse a culminância da sociedade perfeita: o socialismo.
Falar da Revolução Russa neste espaço limitado é um desafio, uma vez que se trata de um tema com várias vertentes, várias conclusões, afastando equívocos e, o que é mais difícil, levantando pontos polêmicos que podem acicatar os ânimos de alguns radicais intolerantes. Afinal, como disse o historiador britânico China Miéville, a Revolução Russa é um capítulo da História no qual escolhemos nossos heróis e nossos vilões.
Não posso deixar de afastar duas conclusões equivocadas sobre a Revolução de Outubro. A primeira, para dizer que não se deve confundir o socialismo que Lênin pretendeu implantar nas quinze Repúblicas que formavam a URSS com o stalinismo, que implantou os gulags e assassinou milhões de compatriotas.
O segundo ponto é sobre o papel de Gorbachev. Os comunistas ortodoxos tem-no acusado de traição à causa revolucionária. Já li sua autobiografia e outras obras sobre o fim da Revolução e não concordo com quem lhe atribui a pecha de traidor. Ele, na verdade, sonhou ingenuamente com um governo comunista humanizado, com liberdade de expressão em que a glasnost e a perestroika afastassem as mentiras oficiais e favorecessem o surgimento de uma nova sociedade no mundo soviético. Esqueceu-se, porém, de que as quinze repúblicas que formavam o bloco socialista estavam reprimidas como um vulcão a ponto de entrar em erupção. A pequena abertura que ele fez foi como tirar a tampa da caixa de Pandora ou soltar o gênio da lâmpada de Aladim. O que vivia debaixo da vigilância da KGB e da disciplina do Partido Comunista estourou como o rompimento de uma represa. E tudo foi de enxurrada, inclusive o próprio Gorbachev, que ficou rodando em círculo.
Avaliar-se a Revolução de Outubro, que completaria cem anos neste 26 de outubro (segundo o calendário Juliano, em vigor na Rússia de 1917), como um fracasso é desconhecer os milagres sociais, econômicos e culturais que ela produziu, tirando um povo de um sistema semifeudal, para transformar a Rússia numa potência mundial, e fazer da URSS uma força política incontestável capaz de conter o avanço americano no mundo inteiro, com as suas garras capitalistas.
Ao contrário do que se alardeia, nem Marx nem o comunismo acabaram. A mais evidente prova é a China comunista exibindo sua força política e econômica, ainda bem vermelha e vencedora.
Com a extinção da URSS, o trem que retornou da Estação Finlândia, onde deixara Lênin, em abril de 1917, continuará seu percurso, recebendo novos sonhadores em várias estações do mundo, rumo a uma nova utopia.
A pletora de obras que está sendo publicada sobre o centenário da Revolução de 1917 traz elementos elucidativos para que se tenha a noção exata dos acontecimentos. Seria bom que fossem lidas e debatidas por aqueles precipitados que emitem opiniões passionais e equivocadas. Sugiro começar com o clássico de John Reed: Dez dias que abalaram o mundo.
Ainda é cedo para a História avaliar com precisão o verdadeiro significado da Revolução do Outubro Vermelho e a influência que teve em todo o mundo, nas mais variadas dimensões.
Lourival de Jesus Serejo Sousa nasceu na cidade de Viana, Maranhão. Filho de Nozor Lauro Lopes de Sousa e Isabel Serejo Sousa. Formou-se em Direito, em
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